terça-feira, 27 de outubro de 2009

Manifesto em defesa do MST

Contra a violência do agronegócio e a criminalização das lutas sociais. Assinam este manifesto diversos intelectuais, ativistas e lideranças.

As grandes redes de televisão repetiram à exaustão, há algumas semanas, imagens da ocupação realizada por integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) em terras que seriam de propriedade do Sucocítrico Cutrale, no interior de São Paulo. A mídia foi taxativa em classificar a derrubada de alguns pés de laranja como ato de vandalismo.

Uma informação essencial, no entanto, foi omitida: a de que a titularidade das terras da empresa é contestada pelo Incra e pela Justiça. Trata-se de uma grande área chamada Núcleo Monções, que possui cerca de 30 mil hectares. Desses 30 mil hectares, 10 mil são terras públicas reconhecidas oficialmente como devolutas e 15 mil são terras improdutivas. Ao mesmo tempo, não há nenhuma prova de que a suposta destruição de máquinas e equipamentos tenha sido obra dos sem-terra.

Na ótica dos setores dominantes, pés de laranja arrancados em protesto representam uma imagem mais chocante do que as famílias que vivem em acampamentos precários desejando produzir alimentos.

Bloquear a reforma agrária

Há um objetivo preciso nisso tudo: impedir a revisão dos índices de produtividade agrícola – cuja versão em vigor tem como base o censo agropecuário de 1975 – e viabilizar uma CPI sobre o MST. Com tal postura, o foco do debate agrário é deslocado dos responsáveis pela desigualdade e concentração para criminalizar os que lutam pelo direito do povo. A revisão dos índices evidenciaria que, apesar de todo o avanço técnico, boa parte das grandes propriedades não é tão produtiva quanto seus donos alegam e estaria, assim, disponível para a reforma agrária.

Para mascarar tal fato, está em curso um grande operativo político das classes dominantes objetivando golpear o principal movimento social brasileiro, o MST. Deste modo, prepara-se o terreno para mais uma ofensiva contra os direitos sociais da maioria da população brasileira.

O pesado operativo midiático-empresarial visa isolar e criminalizar o movimento social e enfraquecer suas bases de apoio. Sem resistências, as corporações agrícolas tentam bloquear, ainda mais severamente, a reforma agrária e impor um modelo agroexportador predatório em termos sociais e ambientais, como única alternativa para a agropecuária brasileira.

Concentração fundiária

A concentração fundiária no Brasil aumentou nos últimos dez anos, conforme o Censo Agrário do IBGE. A área ocupada pelos estabelecimentos rurais maiores do que mil hectares concentra mais de 43% do espaço total, enquanto as propriedades com menos de 10 hectares ocupam menos de 2,7%. As pequenas propriedades estão definhando enquanto crescem as fronteiras agrícolas do agronegócio.

Conforme a Comissão Pastoral da Terra (CPT, 2009) os conflitos agrários do primeiro semestre deste ano seguem marcando uma situação de extrema violência contra os trabalhadores rurais. Entre janeiro e julho de 2009 foram registrados 366 conflitos, que afetaram diretamente 193.174 pessoas, ocorrendo um assassinato a cada 30 conflitos no 1º semestre de 2009. Ao todo, foram 12 assassinatos, 44 tentativas de homicídio, 22 ameaças de morte e 6 pessoas torturadas no primeiro semestre deste ano.

Não violência

A estratégia de luta do MST sempre se caracterizou pela não violência, ainda que em um ambiente de extrema agressividade por parte dos agentes do Estado e das milícias e jagunços a serviço das corporações e do latifúndio. As ocupações objetivam pressionar os governos a realizar a reforma agrária.

É preciso uma agricultura socialmente justa, ecológica, capaz de assegurar a soberania alimentar e baseada na livre cooperação de pequenos agricultores. Isso só será conquistado com movimentos sociais fortes, apoiados pela maioria da população brasileira.

Contra a criminalização das lutas sociais

Convocamos todos os movimentos e setores comprometidos com as lutas a se engajarem em um amplo movimento contra a criminalização das lutas sociais, realizando atos e manifestações políticas que demarquem o repúdio à criminalização do MST e de todas as lutas no Brasil.

Assinam esse documento:

* Eduardo Galeano - Uruguai
* István Mészáros - Inglaterra
* Ana Esther Ceceña - México
* Boaventura de Souza Santos - Portugal
* Daniel Bensaid - França
* Isabel Monal - Cuba
* Michael Lowy - França
* Claudia Korol - Argentina
* Carlos Juliá – Argentina
* Miguel Urbano Rodrigues - Portugal
* Carlos Aguilar - Costa Rica
* Ricardo Gimenez - Chile
* Pedro Franco - República Dominicana


Brasil:

* Antonio Candido
* Ana Clara Ribeiro
* Anita Leocadia Prestes
* Andressa Caldas
* André Vianna Dantas
* André Campos Búrigo
* Augusto César
* Carlos Nelson Coutinho
* Carlos Walter Porto-Gonçalves
* Carlos Alberto Duarte
* Carlos A. Barão
* Cátia Guimarães
* Cecília Rebouças Coimbra
* Ciro Correia
* Chico Alencar
* Claudia Trindade
* Claudia Santiago
* Chico de Oliveira
* Demian Bezerra de Melo
* Emir Sader
* Elias Santos
* Eurelino Coelho
* Eleuterio Prado
* Fernando Vieira Velloso
* Gaudêncio Frigotto
* Gilberto Maringoni
* Gilcilene Barão
* Irene Seigle
* Ivana Jinkings
* Ivan Pinheiro
* José Paulo Netto
* Leandro Konder
* Luis Fernando Veríssimo
* Luiz Bassegio
* Luis Acosta
* Lucia Maria Wanderley Neves
* Marcelo Badaró Mattos
* Marcelo Freixo
* Marilda Iamamoto
* Mariléa Venancio Porfirio
* Mauro Luis Iasi
* Maurício Vieira Martins
* Otília Fiori Arantes
* Paulo Arantes
* Paulo Nakatani
* Plínio de Arruda Sampaio
* Plínio de Arruda Sampaio Filho
* Renake Neves
* Reinaldo A. Carcanholo
* Ricardo Antunes
* Ricardo Gilberto Lyrio Teixeira
* Roberto Leher
* Sara Granemann
* Sandra Carvalho
* Sergio Romagnolo
* Sheila Jacob
* Virgínia Fontes
* Vito Giannotti


Para subscrever esse manifesto, clique no link: http://www.petitiononline.com/boit1995/petition.html

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

‘Estaremos contra o golpe enquanto estiverem no poder’

Entrevista concedida por Juan Barahona, líder da resistência hondurenha, a Pedro Fuentes, secretário de Relações Internacionais do PSOL

Tegucigalpa, 2 de outubro de 2009

“Não temos prazo, estaremos contra o golpe até que estejam pelo último dia no poder.” Assim disse Juan Barahona numa entrevista realizada na sede do STYBIS, Sindicato dos Trabalhadores de Bebidas e Afins. Barahona é hoje o principal líder da resistência, junto com Carlos Reyes, presidente desse sindicato e também seu companheiro próximo e candidato independente nas últimas eleições. O fato de que Reyes esteja ferido e não possa participar ativamente faz com que Barahona seja a cabeça mais visível da resistência, sendo entrevistado nas rádios e requisitado pela imprensa e também por ativistas e militantes.

Ele tem 55 anos e iniciou sua militância em 1975, no movimento estudantil. Em 1977, ingressou no Partido Comunista. Militou lá até sua dissolução. Vale lembrar que o partido se auto-dissolveu depois da queda do Muro de Berlim. Mas uma grande parte dos quadros do PC hondurenho não parou sua militância, ficando apenas sem uma organização. Até que em 1995, com o encontro com militantes salvadorenhos da Tendência Revolucionária, fundaram a organização em Honduras. A TR se formou a partir da FMLN - Frente Farabundo Martí de Liberación Nacional em El Salvador quando este partido se transformou devido à assimilação eleitoral e ao oportunismo.

Juan Barahona não pára um minuto. Conseguiu fazer uma pausa para nos dar esta entrevista no STYBIS, que faz parte da FUT - Federação de Trabalhadores de Honduras, da qual é presidente. Além disso, preside o Sintraina, sindicato que foi desocupado há dois dias.

“O que perdemos nos 90 recuperamos nos 2000”

Barahona começou a entrevista nos falando de sua história e do Bloco Popular, que se formou em 2000 e que hoje tem sido fator decisivo na resistência. Essa frente formada pelo Bloco agrupa os sindicatos campesinos filiados à FUT, partidos e organizações de esquerda, entre elas a TR. O BP foi o motor das mobilizações que dominaram a década de 2000.

“Nos anos 90, a luta foi extremamente defensiva. No caso do nosso sindicato, Sintraina, encarregado da relação do governo com os campesinos, fomos despedidos em 93. Fizemos uma greve de fome em frente à embaixada gringa por 10 dias e a suspendemos numa negociação na qual nos prometiam reincorporação”, lembra. “A partir de 2000, a situação mudou. Desde então, a luta é contra o modelo neoliberal e o sistema. A partir deste ano, a FUT organiza o Bloco Popular, junto com organizações campesinas, professores e populares, e agora estamos nas ruas.” Com essa organização, se travaram grandes batalhas. Foram feitos bloqueios e greves. “No ano passado, o Bloco organizou uma greve em 17 de abril. Em maio, quatro fiscais do Estado iniciaram uma greve contra a corrupção. Foi um movimento exemplar, com o qual se acabou bloqueando todos os caminhões e praticamente parou o país.” Houve outra greve geral em agosto e outubro, com uma pauta de reivindicação de 12 pontos, que foram apresentados ao governo e negociados com Manuel Zelaya (Mel).

“A Frente Nacional da Resistência tem reunido a maioria da população”

“A Frente Nacional da Resistência é uma coordenação entre o Bloco Popular, a União Democrática, as centrais sindicais e o setor popular do Partido Liberal, que defende Mel. Aqui está reunida a maioria da população.”

“Honduras mudou completamente, e vamos tirar um resultado muito positivo de tudo isso; uma organização e uma grande experiência. Nesses dias de lutas, o nível de consciência se elevou muito mais que em cem aulas sobre a luta de classes. É um divisor de águas. É luta de classes; de uma lado o povo explorado, e do outro a burguesia, os grandes burgueses que dominam este país. Os mesmos liberais que estão na resistência os vêem assim. É muito fácil argumentar que é uma luta de pobres contra ricos, meter todos eles num só grupo.”

A atual conjuntura

“Estamos diante de uma conjuntura que é complicada. Enquanto a repressão continua, agora se fala de negociações. Nós somos a favor de participar como resistência das negociações, não fechamos o diálogo. Vemos que há rupturas dentro do regime. A viagem dos deputados do Brasil é importante, apoiando a presença de Zelaya em sua embaixada. Se vierem a OEA e a ONU, será bom. Até agora não fizeram nada porque jogam a favor do império. Esperamos que demonstrem empenho. Estamos a favor de participar das negociações, mas ao mesmo tempo dizemos aos golpistas que não temos prazo; estaremos nas ruas até o último dia em que estiverem no poder.”

“O futuro é nosso”

“Carlos Reyes é o candidato independente, da resistência e do movimento popular à presidência. Se participa ou não das eleições, é uma questão de se aceitar as condições e que seja com Zelaya no poder. De acordo com a situação, estudaremos o que fazer.”

“O futuro é nosso. Mais nada será igual em Honduras, e a disputa de poder se dará agora ou mais adiante. A resistência tem condições de organizar um movimento político social para lutar pelo poder.”

“Hoje, acabamos de receber uma grata notícia dos Estados Unidos. Nos informaram que os estivadores decidiram boicotar a descarga de produtos das maquilas daqui. É muito bom golpear os empresários. Se não fosse por eles e pela direita da América Latina, não existiria golpe de Estado em Honduras.”

“Nós seguimos organizando a resistência e continuamos nas ruas. Na quarta-feira fomos dispersados, mas hoje conseguimos sair de novo; marchamos desde a embaixada dos EUA, passamos pelo CORE, onde estão detidos os campesinos que foram retirados do INA, e terminamos no centro da cidade.”

Mais informações sobre Honduras no Blog da Secretaria de Relações Internacionais do PSOL:

http://internacionalpsol.wordpress.com/

sábado, 3 de outubro de 2009

Dirigentes do MTL são condenados à prisão por lutarem pela Reforma Agrária

www.mtl.org.br
2 de outubro de 2009

João Batista da Fonseca, membro da Coordenação Nacional do MTL e presidente do PSOL de Minas Gerais; e Wanduiz Evaristo Cabral, o Dim Cabral, membro da Coordenação Estadual do MTL e da Executiva Estadual do PSOL/MG, foram injustamente condenados a 5 anos e 6 meses de prisão por lutarem a favor da Reforma Agrária. Ambos são vítimas de processos criminais que foram propostos pelo Ministério Público da cidade de Uberlândia em 2001, por ocasião da luta pela desapropriação da Fazenda Tangará.

Condenados em primeira instância por roubo e incitação ao crime pelo juiz Joemilson Donizetti Lopes, João Batista e Dim Cabral foram vítimas agora, da 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, que confirmou a condenação dos mesmos, em decisão no último dia 22 de setembro.

Num segundo processo julgado em primeira instância pelo mesmo juiz Joemilson Donizetti Lopes, João Batista, Dim Cabral e Marilda Ribeiro, advogada e coordenadora do MTL, foram novamente condenados por extorsão, incitação ao crime e formação de quadrilha. De acordo com a denúncia, os dirigentes do Movimento "se associaram para a prática de crimes, saqueando e invadindo terras particulares, comandando e incitando pessoas à prática de crimes de roubo de gado, veículos, equipamentos agrícolas e objetos pertencentes à Fazenda Tangará. Consta ainda que exigiam das vítimas o pagamento de 30% do salário de aposentadoria percebido, sob ameaça de não receberem pontuação para aquisição de uma eventual gleba de terras".

Os termos desta denúncia do Ministério Público, acatada pela Justiça em Minas Gerais para condenar os dirigentes do MTL revela toda a carga de preconceitos e discriminação usada para destruir a vida de pessoas de bem e preservar o direito de propriedade da terra acima de sua função social.

A Fazenda Tangará, uma área de mais de 5000 hectares, localizada no município de Uberlândia, que era de propriedade da CIF - Companhia de Integração Florestal, uma empresa que recebeu vultosos recursos públicos para o cultivo de eucalipto na década de 70, foi considerada improdutiva pelo INCRA. Em torno de 700 famílias coordenadas pelo MTL ocuparam-na, pela primeira vez, em 1999, que após despejo promovido pela polícia montaram acampamento na rodovia por 6 meses, e a reocuparam em março de 2000. A partir daí se estabeleceu um intenso conflito, que envolveu a polícia, juízes e promotores que sempre atuavam para defender os interesses do latifúndio improdutivo e de tudo faziam para derrotar a luta dos trabalhadores sem terra. Hoje a área é um grande assentamento onde vivem mais de 250 famílias.

É flagrante pelas provas constantes dos autos, inclusive pelo depoimento das próprias testemunhas de acusação, que os acusados não cometeram os crimes pelos quais foram sentenciados. O Juiz criminal ao sentenciar, não agiu de forma isenta, e sim por vingança contra a luta pela desapropriação da Fazenda Tangará. Aquele latifúndio, desapropriado, no curso da instrução criminal, foi o palco de uma grande derrota de um setor conservador da justiça em Minas Gerais que, determinara a desocupação da fazenda, decisão esta, que foi rechaçada, firmemente, pelo então Governador Itamar Franco.

Com exceção do governo de estado à época, ficou clara a aliança dos poderes locais e nacionais contra as famílias dos trabalhadores, os quais, sustentados pela polícia local e pela justiça mineira, tentaram de todas as formas, intimidá-los a desistirem da luta pela desapropriação daquele latifúndio. Como não conseguiram, tentam agora, criminalizá-los.

É preciso impedir a prisão dos companheiros João Batista, Dim Cabral e Marilda Ribeiro. Conclamamos a solidariedade aos lutadores sociais que são vítimas desta inaceitável condenação e a mobilização contra este ato de injustiça e perseguição política.

Movimento Terra Trabalho e Liberdade - MTL

Enviar mensagens de apoio e solidariedade: nacional@mtl.org.br Este endereço de e-mail está protegido contra spambots. Você deve habilitar o JavaScript para visualizá-lo. / fjoama@yahoo.com.br